Maria Avelina Fuhro Gastal
Primeiro, viver o verão. Desnudar o corpo, abandonar o relógio, dormir quando quiser, comer quando tiver fome, beber para relaxar, para brindar, para comemorar, para ter o que fazer, para matar a vontade, para aumentar a vontade. Desejar a mulher do outro, o homem da outra, a bunda e as coxas dos salva-vidas, o peixinho frito, o pastel de camarão, de queijo, de siri, a pizza de anchovas, o sonho de doce de leite, o sorvete sequinho ou coberto de guloseimas. Comer o que der, fantasiar com o que não rolar. Liberar geral no Carnaval, beijar qualquer um, não lembrar do que fez, esquecer de quem é.
Daí voltar para a rotina. Vestir a fantasia de sérios, cumprir prazos e tarefas, pagar a fatura astronômica do cartão pós-verão, organizar a agenda dos filhos, comprar material escolar, acordar as crianças, alimentar, orientar, educar, assistir, apoiar, punir, confrontar, exigir. Encontrar amigos, almoçar com a grande família aos domingos, pagar multas, buscar vaga para o carro, voltar para a academia, retomar a dieta e a posição papai e mamãe. Enfrentar tudo com energia e esperança, com a certeza de que a Páscoa logo chegará e teremos, pelo menos, três dias de ócio, mesa farta, muito chocolate e vinho. Quem sabe uma fugidinha à praia ou à serra?
Entre o final do primeiro e o final do segundo parágrafo estamos vivendo a Quaresma. Período destinado à recuperação do corpo após a luxúria e antes da gula.
Publicado na Coletânea "Por Cima é Millôr", 2019
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