Dia do gordo


Maria Avelina Fuhro Gastal

Você sabia do dia do gordo? Vi nas redes sociais e me surpreendi. Existe o dia do magro, do alto, do baixo? Também desconheço. Mas se for para vender algo, pode ser que venham a existir. Vendem uma data, criam uma necessidade e compramos as promessas em suaves prestações no cartão de crédito.

Mas, e o dia do gordo? Comemoração, celebração ou deboche?

Fui gorda minha vida inteira. Comemorar, celebrar ou servir de chacota me parecem de péssimo mau gosto. Há quem lide bem com o excesso de peso, não se afete nem mesmo se importe. Nunca fui assim.

Gostar de uma roupa e não ter do meu tamanho, vestir algo e me sentir como uma barraca sem forma, comprar o que serve e nunca o que se deseja são experiências duras. Não preciso do riso ou do olhar de ninguém desaprovando o meu tamanho para me sentir péssima, seria só um elemento a mais, totalmente desnecessário.

Ser gorda antecede o sorriso, as palavras, a presença. Definia a mim. Antes de ser eu, era a gorda. Não tinha dúvidas de que era assim vista, lembrada e identificada. Então, para que serve o dia do gordo? Brincar com a dor de muitos?

Há três anos decidi tentar eliminar peso mais uma vez. Mais uma tentativa entre tantas. Na primeira avaliação, estabeleci como meta de 10 a 13 kg. Não que eu achasse o suficiente, mas não acreditava possível mais do que isso. O discurso foi coerente, o suficiente para melhorar a saúde. Falar na incerteza poderia desmascarar a dor. Nem em terapia tocava no assunto. Hoje são 27kg a menos, mantidos já por dois anos e meio.

Magra? Não. Nem mesmo “normal”. Ainda sou a gorda que tem medo de entrar em uma loja e ser olhada como alguém que não deveria estar ali. Peço sempre número maior morrendo de medo de que a roupa não me sirva, não acredito que o tamanho P possa ser usado por mim. Arriscar usando branco, cintura marcada, calça justa, listas, vestido reto, saia lápis, cores claras, blusas ajustadas ao corpo exigem horas de exame minucioso frente ao espelho e uma luta árdua para não desistir e optar pelo preto largo e desforme.

O dia do gordo é, para mim, mais uma das perversidades da nossa sociedade. Desrespeito, falta de empatia parecem ser o lema da nossa época, transformados em piadas e gracejos maldosos.

“Rir de tudo é desespero” (Frejat).

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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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