Cotidiano


Maria Avelina Fuhro Gastal

Todos os dias o alarme do calendário avisa os compromissos agendados: academia, pilates, massagem, terapia, manicure, grupo de escrita, grupo de estudos, Tai Chi, inglês, Clarices, dança.

Todas as vezes, o dilema: silencio o alarme, elimino os compromissos na rua, refaço a agenda?

Todos os dias a incapacidade de silenciar, eliminar ou refazer. Todas as vezes o temor de tornar rotina o que não deveria ser normal.

A cada dia, levantar, tomar café, fazer exercícios, organizar e limpar a casa, tomar banho, cozinhar, comer, buscar o sol entre os vidros, virar as costas para a rua, ligar o computador, sorrir, falar, brincar, aprender, conviver on line, ligar a televisão, desistir do noticiário, escrever, assistir lives, fazer um lanche, ler um livro, cansar do dia de hoje, igual ao de ontem, idêntico ao de amanhã, deitar, ler, assistir a um filme, jogar no celular, desistir, dormir para de novo acordar e fazer tudo igual mais uma vez.

Em cada dia, diferente. Às vezes com ânimo, outras com total desânimo. Limpeza da casa por hábito, por mania, por prazer, por vontade. Com fúria quando o desejo é de gritar com o mundo, de forma automática quando para acalmar minha necessidade de ordem, com pagode tocando quando a sensação de ter uma casa do meu jeito me basta para enfrentar o cotidiano.

Todos os dias o silêncio. Tão denso quanto a bateria de uma escola de samba. Ocupa cada espaço de forma tão intensa que mais nada pode ser ouvido. Abre frestas para o desejo louco de ouvir vozes e risadas que não estão aqui. Encontram-se nas casas que habitam e, embora na mesma cidade, a distância é intransponível.

A cada dia, a esperança de tudo acabar logo ou a desesperança em que vá acabar logo; o cansaço da situação ou a energia para enfrentar o absurdo; o medo da morte ou a coragem de aguentar pela vida.

O cotidiano esmaga-nos com uma rotina imposta pelo isolamento, pela incerteza. Às vezes, nocauteamos a ele com força e garra. Noutras, quase sucumbimos. Os sentimentos se debatem, se contrapõem. Não temos como evitar.

O desafio é encontrar maneiras para não nos deixar vencer.

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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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