Maria Avelina Fuhro Gastal
Há um ano e quatro meses, fiz da minha casa trincheira. Nela me protegi do vírus a que todos ameaça. Fora dela ficaram, também, família, amigos, afeto e vida.
Entrincheirados, estamos sempre vigilantes. Respondemos à possibilidade de ataque com fúria. Não nos permitimos relaxar, esquecemos de olhar para o céu, não enxergamos o pôr-do-sol, ignoramos o canto dos pássaros, não temos acesso ao colorido da natureza. Estamos sós. Temerosos, angustiados, desesperançosos.
Para não sucumbir ao vírus nem ao ódio nem ao desprezo pela vida que contamina o nosso país, fiz da minha trincheira, concha.
As impurezas e maldades que entram pelas redes sociais, pelos noticiários de televisão, depoimentos na CPI da Covid e falas do presidente perverso me causam profunda irritação. Nesse processo, combato os invasores e não permito que destruam minha estrutura. Uso o ataque deles para construir defesas e argumentos que neutralizem parasitas. Escolho ser pérola, jamais gado.
Descanso em um casulo. Sem pressa de me livrar dele para que minhas asas se desenvolvam e me permitam um voo longo e gracioso. Não importa quão curto possa ser, desde que me leve de volta a um mundo mais colorido, onde todos os cantos sejam apreciados, todas as palavras ouvidas, todas as pessoas respeitadas.
Entre trincheira, concha e casulo, sigo. Já não conto dias, coleciono expectativas e alimento sonhos. Entre eles, o de poder estar livre para abraçar.
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