Maria Avelina Fuhro Gastal
Silenciem os tambores, as britadeiras, as vozes sem rostos, as sirenes, os alarmes, os monitores, as buzinas e freadas, os motores, os gritos, os xingamentos, as discussões. Eles enchem nossos ouvidos e nos impedem de escutar.
Somente no silêncio podemos perceber o farfalhar das folhas, o canto das cigarras, o vai e vem das ondas, o murmúrio dos ventos, os pingos da chuva nos telhados, nas vidraças e calhas.
Isolados dos barulhos que nos cercam, escutamos nossos desejos, nossas saudades. Retornamos a sons que nos acompanham em lembranças. Ruídos corriqueiros, frases e palavras recorrentes ganham novo significado quando aliadas a nossa memória.
Seu nome dito por alguém especial tem outra sonoridade. O “Eu te amo” banalizado reconecta-se com aquele momento em que essas três palavras eram tudo que desejava ouvir.
Ser chamado, pela primeira vez, de mãe, pai, vovó, vovô, didi, seja qual for a maneira que essas palavras forem ditas pela criança, nos definem e nos reconhecem em um lugar de afeto e permanência.
O batimento cardíaco do bebê ainda no útero, o seu choro após o nascimento, os balbucios e risadas, as primeiras tentativas de palavras provocam em nós emoções, fazendo da escuta o caminho para o fortalecimento do vínculo.
Inigualável o barulho da chave na fechadura indicando a chegada do filho, já crescido, em casa.
Mesmo na rua, há sons que, se escutados, nos remetem a vivências. Não são apenas barulhos que ouvimos, são memórias adormecidas que compõem a nossa história. O badalar dos sinos me traz sensação de aconchego, talvez por fazer parte da minha infância, quando o sino da Igreja das Dores inundava a minha casa, lugar em que ainda me imaginava segura.
Escute para onde aquela música lhe leva. Reviva momentos bons, enfrente os doídos. Calar o que machuca pode transformar o sussurro em gritos.
Ouvimos bombardeios, palavras de ódio, gritos de sofrimento e fome. Precisamos escutar o que some entre tantos barulhos. Escutar para não emburrecer; escutar para não enlouquecer.
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