Caixa de chás


Maria Avelina Fuhro Gastal

Há algum tempo, minha relação com caixa de chás vem sendo motivo de comentários. Em nenhum deles há demonstração de entendimento básico da finalidade dessa caixa. Situam-se entre deboche, piada e suposta confirmação de um diagnóstico de Transtorno Obsessivo Compulsivo.

Como o nome já diz, trata-se de uma caixa, o que pressupõe a possibilidade de organização elementar que facilite a escolha do sabor do chá a ser bebido. Se não fosse para isso, bastaria termos um saco de chás, onde colocaríamos a mão e sortearíamos de forma aleatória um dos chás ali colocados, sem que nossa vontade ou preferência tivesse vez.

Quando abro uma caixa de chás, em qualquer lugar do mundo, tenho a expectativa de encontrá-los agrupados de forma coerente para que eu não perca tempo vasculhando uma infinidade de sabores jogados ali desordenadamente. Portanto, se minha expectativa é frustrada, antes de qualquer escolha, procedo a uma organização mínima do conteúdo da caixa.

Essa atitude é rotulada como um traço inequívoco de TOC, demonstrando um desconhecimento da diferença entre os conceitos de ordem e de harmonia.

Não prezo a ordem. Ela é burra, limitadora, não acolhe diferenças nem possibilidades de reorganização. Enquadra tudo em critérios pré-estabelecidos, ditados por quem não acredita em alternativas e enxerga em qualquer desvio da sua vontade, desobediência ou insubordinação.

A harmonia aposta na diversidade, não estabelece critérios engessados, abre espaço para a criatividade, convive com as diferenças oportunizando reagrupamentos que acolham os desiguais.

Nos quartéis, nas religiões, nos grupos fanáticos, nas ditaduras a ordem é lema.
Nas artes, na fé, nos grupos de trabalho voluntário, nas democracias a harmonia é o princípio básico de respeito ao outro.

Um desfile militar, é ordem. Guernica de Picasso é harmonia. O primeiro padroniza movimentos. O segundo, compõe em seus elementos, denúncia pelo horror causado por ações baseadas na ordem, disciplina e obediência.

A desorganização alimenta a ordem. A harmonia organiza espaços, liberta possibilidades.

Caixa de chás precisam ser harmônicas. Há tantas possibilidades de agrupamento, cores do envelope da mais clara à mais escura, ou vice-versa, ordem alfabética de a à z ou de z à a, critérios estabelecidos por ordem vertical ou horizontal ou qualquer outro pensado por quem organiza.

Harmonia não é frescura nem sintoma, na desordem aceitamos o que vem, perdemos a habilidade de fazer escolhas compatíveis com o nosso querer, respeitando o querer do outro.




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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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