Maria Avelina Fuhro Gastal
Em 2 de abril de 1805, nascia Hans Christian Andersen, considerado o pai do conto de fadas moderno. Por isso, 2 de abril é o dia mundial da literatura infantil.
Mais de 160 anos após o nascimento de Hans Christian Andersen, foi através dele que se deu meu primeiro encantamento com um livro. Carregava “Os contos de Andersen” para cima e para baixo. Não sei que fim levou. Talvez tenha sido doado ou, quem sabe, destruído. Melhor não saber.
Muito antes dos filmes de Walt Disney, eu li os contos dos Irmãos Grimm. Contos de fadas, sem a intermediação da indústria cinematográfica, são duros, cruéis, vingativos. Não fogem dos aspectos perversos e sinistros que a humanidade traz em si.
Tendo crescida tão próxima a cinemas, passei a ler as adaptações desenvolvidas para o público infantil. Contos de fadas não são para crianças. Será?
Hoje, tememos que as meninas fiquem à espera de um príncipe encantado para viverem felizes para sempre. Lutamos contra algo que talvez nem importe para elas. Nunca esperei pelo príncipe, ele sempre foi coadjuvante nas histórias. Nem mesmo me identificava com as princesas, prontas para serem salvas por um beijo. Para mim, inesquecíveis eram: o Patinho feio, o Dumbo, a fada Primavera e o Grilo falante.
O Patinho feio destoava. Não tinha a imagem que era esperada para ele, não era gracioso, estava sempre sozinho. O Dumbo carregava uma tristeza, um incômodo por não corresponder ao padrão e um sentimento destruidor de inadequação. A fada Primavera, gordinha, destrambelhada, mas com uma alegria constante e muita perseverança e clareza na busca de seus objetivos. O Grilo falante, um chato, sem a leveza necessária para se divertir, sempre cuidando daquilo estabelecido como certo.
Todos esses personagens povoam minhas sessões de análise. Eles estão em mim. A possibilidade de me identificar com eles trouxe algum conforto durante a infância. Em alguns momentos já me vi como um cisne, já voei, surpreendendo muitos, rodopiei de alegria, sem perder o foco nos meus objetivos, dou cacetadas constantes no Grilo falante que sou.
Quando meu filho tinha uns cinco anos, comprei uma coleção de livros infantis sobre animais. Ele sempre escolhia o livro do leão para que eu lesse antes dele adormecer. Depois de um tempo, combinei que, a partir daquela noite, eu primeiro leria sobre outro animal e depois o leão. Foi assim por quinze dias. No décimo sexto, Eduardo perguntou se já tinham acabado todos os animais. Sim, tínhamos lido todos e mais o leão.
─ Que bom. Então agora pode ser só o leão.
E assim foi. Continuamos no leão até que o Manual do Escoteiro Mirim, Walt Disney, desbancou o rei da floresta.
Não há tela que substitua a experiência conjunta da leitura de um livro. Estar com a criança, contar e recontar, experimentar um mundo que trazemos adormecido em nós, compartilhar aventuras, emoções, desafios, construir uma realidade pelos olhos infantis, fazer parte dessa realidade como parceiros, deixar que a criança mergulhe em seus temores, conflitos, sem a nossa censura ou repreensão, domando nossa mania de buscar a moral da história ou criticando a fantasia com base na nossa vivência, enfim, apenas lendo, imitando vozes e deixando que a crítica seja construída à medida que crescem.
Com certeza, nenhuma menina crescerá princesa e nenhum menino, salvador. Beijo nenhum garantirá felicidade eterna. Confiemos nas crianças e na capacidade delas de lerem o mundo e as pessoas. Não precisamos desmantelar a fantasia.
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