Ele riu


Maria Avelina Fuhro Gastal

Antes de se levantar da cadeira, caminhar até o palco e esbofetear Cris Rock, Will Smith riu.

Ele riu como nós rimos de agressões mascaradas em piadas e gracejos dirigidas a outras pessoas ou grupos étnicos e sociais.

Ser preto, ser gay, ser gordo, ser mulher, ser feio, ser judeu, não ser o que a sociedade branca hetero normativa, machista, racista, homofóbica e centrada na supremacia europeia determina, autoriza o riso. E nós rimos.

Se criticados pelo riso, transformamos a crítica em mi-mi-mi e reclamamos de um policiamento grotesco do politicamente correto, da tentativa de cerceamento de nossa liberdade de expressão. Incrementamos a piada, ignoramos a dor.

O riso mantém a discriminação e, ainda, se arvora de direitos que nada mais são do que a negativa dos direitos do outro. Nada existe além de mim. Arque com o preço de você também não existir para além do outro.

Hoje, rimos. Amanhã, rirão de nós. Nosso corpo, nosso jeito de ser, de falar, de vestir, de comer, de amar serão a piada que nos fará chorar ou revidar.

Um tapa, um soco, um pontapé, um tiro, uma revolta, um levante, uma revolução. A corda vem sendo esticada, a violência normalizada, as agressões diárias não encontram elementos institucionais para defesa dos agredidos. A reação é resposta. Violência é a ação contínua de uma sociedade que ri de si mesma, pensando estar rindo dos outros.



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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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