Maria Avelina Fuhro Gastal
Minha primeira fantasia foi de boneca. Vestidinho “de sair”, sapatinho de verniz e uma tiara nos cabelos. Zero no quesito originalidade, dez no quesito criatividade de mãe ao enrolar uma criança. E deu certo. Meu sorriso nas fotos mostra que eu estava certa de que era uma bonequinha. Depois vieram bailarinas com poses de Royal Ballet, havaiana, de sarongue vermelho, colar de plástico com flores brancas que se repetiam no cabelo e nos chinelos de dedo. Nessa época tinha cerca de nove anos, um abdômen avantajado, pernas em X, bochechas de bulldog. As fotos são lamentáveis. A seguir veio uma tirolesa, que espanta pelo olhar triste, apesar de ser carnaval.
Dos bailes infantis aos bailes do Petrópole Tênis Clube. Um arraso. Cinco noites, sem parar. Sempre acompanhada dos meus pais que deviam ter a doce ilusão de poder nos controlar em um ginásio enorme, atrolhado de gente, onde estar do lado oposto à mesa deles era a tarefa mais fácil de uma adolescente. Difícil era me livrar dos pais que estavam dentro de mim.
Até carnaval de rua em Porto Alegre eu fui. Era ainda na Avenida João Pessoa e, mesmo sem ser nenhum Rio de Janeiro, achei bem legal.
Da adolescência à maternidade, dos bailes e carnaval de rua aos desfiles do Rio de Janeiro, pela TV. Por anos, na casa dos meus pais, entre amigos e família, avaliamos todos os desfiles, dando notas, fazendo apostas, inventando lanches. Duas madrugadas inteiras, seguidas, e muito aguardadas ao longo do ano.
Continuei assistindo aos desfiles nas madrugadas na praia quando os filhos, adolescentes, estavam na folia. Jamais consegui dormir sem que eles estivessem em casa. Sobrevivi. E os meus filhos também.
Entre fantasias, bailes, desfiles descobri que gosto de carnaval, mas não sou uma grande foliã. Gostaria de estar na Sapucaí, mas não no asfalto. Não me imagino em um trio elétrico nem em um bloco. Acho que não aguentaria uma noite de baile. Posso até dormir tarde, mas lendo, conversando, escrevendo ou jogando candy crash.
De alguns anos para cá, descobri meu carnaval ideal. Desfilo pelas avenidas de Porto Alegre. Olho para onde poderiam estar as arquibancadas e consigo enxergar os prédios sempre invisíveis na rotina dos dias. Troco o colorido dos blocos e fantasias pela explosão de cores nas árvores e flores dos parques e canteiros. De enredos, escrevo contos, invento histórias. Aprecio a evolução nos filmes que assisto em cinemas sem filas, em assentos possíveis de escolher, entre uma infinidade disponível. Troco uma madrugada de desfiles por um compacto dos melhores momentos. Formo bloco com amigos para um café, uma conversa, algumas risadas. Sambo na cara da tristeza, da solidão e da desesperança. Na quarta-feira de cinzas, tenho a certeza de ter encontrado a harmonia para me impulsionar a superar os desafios do ano e um pouco da energia necessária para suportar o Brasil dos demais 361 dias.
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