Chorriso


Maria Avelina Fuhro Gastal

Rir é o melhor remédio, mas “rir de tudo é desespero”.

Que motivos temos para rir? Como rir sem pensar nos milhões que choram, que passam fome, que moram nas ruas?

O verde amarelo do Brasil foi usurpado de nós para se transformar em uma grande mancha escura que cobre o nosso mapa. Mancha formada por corpos em decomposição, por asfixia à espera de leito que não chegará antes da morte por sufocamento.

Deixamos de ser o país da alegria, das cores tropicais para nos tornarmos risco sanitário mundial. O país do futuro chegou nele enterrando seus cidadãos em covas quaisquer. Um presente de terror, desmandos e perversidade.

Nas redes sociais, o ódio recíproco perde espaço para as manifestações de luto. Não são só Marias e Clarices que choram. Choram todos que não compactuam com as mentes sádicas e doentias que governam o país.

Vamos acumulando tristezas, desesperança, raiva. Esvaziados da possibilidade de estarmos juntos, de nos aninharmos ou de acolhermos em um abraço, nos afogamos no sofrimento de cada um e de todos. Como rir?

Não precisamos gargalhar. Não somos perversos para debochar, desumanos para ignorar a realidade nem calhordas para negá-la. Mas temos que achar espaço para o riso. Aquele que nos enternece, alivia a ansiedade, nos dá fôlego para reagir.

Eles vibram com o nosso sofrimento. Apostam nisso para vencer. Transformar-nos em amargos, raivosos, desprovidos de esperança. Nossas armas são o afeto, a solidariedade, o respeito ao outro. Eles as desconhecem. São movidos por ódio. Não deixemos que nossa raiva nos transforme na abominação que eles são.

De longe, separados, afastados para não perpetuar a dor e a morte, podemos nos acarinhar, dar suporte ao sofrimento, acolher os temores, provocar sorrisos, conter ou dividir lágrimas. Não estamos sós. Não podemos permitir que eles nos derrotem. Só sairemos dessa agonia em que o país se transformou se não os deixarmos nos aniquilar pela crueldade diária a que somos submetidos.

Vamos chorar, vamos sentir, mas, também, vamos rir, às vezes. Criar forças e estratégias para que o riso contínuo de desespero seja deles.

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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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