Zen


Maria Avelina Fuhro Gastal

Decidi buscar modos de ser mais compatíveis com a minha idade.

Meu foco é alcançar a sabedoria e a serenidade, deixando meus arroubos juvenis no passado. Controlar a língua, a fala, a expressão facial, a pororoca que me invade e transborda em discursos infindáveis.

Determinada, busquei informações sobre meditação e mindfulness. O pensamento que me orientava era, nem que fosse pela força do ódio, eu conseguiria fazer essas merdas. Péssimo começo, sinal inequívoco da necessidade de acalmar a mente e esvaziar meu coração do ódio.
Meditação me pareceu uma exigência além das minhas possibilidades, que são mínimas. Falta em mim um botão de Foda-se mais potente do que aquele capaz de detonar o arsenal atômico do planeta. Acha exagero? Abstrai, então, o derretimento do planeta, a inundação das cidades, os furacões em série, as guerras, o extermínio de populações inteiras, a fome no mundo, as desigualdades sociais, o avanço da extrema direita, a incapacidade da esquerda em se conectar com as mudanças sociais e culturais. Se você pouco se importa com tudo isso, pense então nos boletos a pagar, na fatura do cartão de crédito, nos quilos que quer eliminar.

Esvaziar a mente, ignorar acontecimentos externos e pensamentos, só sob efeito de fortes opioides. E olhe lá. Talvez minha “viagem” aconteça em uma trilha acidentada e não em um campo de girassóis.

Mindfulness me pareceu mais plausível. Tem algo de controle, que eu adoro. E é apresentada como técnica de desenvolvimento pessoal. Deu match com a minha intenção. No fim o que eu quero é o controle do meu corpo e emoções. De quebra, potencializa a atenção e a concentração, o que está me faltando para finalizar a droga do livro de crônicas que há mais de ano um pouco escrevo e outro tanto, enrolo.

Antes de começar, li cada uma das etapas para poder perceber futuras dificuldades. Primeiro parágrafo, primeira dificuldade. E a segunda e a terceira na sequência.

Dificuldade 1: escolher um local calmo para sentar ou deitar onde nada me incomodaria. O que eu faço com o barulho dos carros passando, com o bate-boca dos guardadores de carro? Sentar em que posição? E os meus isquiotibiais levariam quanto tempo para incomodar? Deitar na cama ou chão? E se eu pegar no sono? E se eu não conseguir me levantar do chão?

Dificuldade 2: escolha uma palavra e a repita como mantra. Só palavras de ordem. Foi-se qualquer possibilidade de calma na mente. A lista de perversos para acompanhar a palavra FORA cresce e sinto minha pressão sanguínea aumentar. Oh, já estou percebendo as reações do meu corpo e, do jeito que as coisas andam, infarto logo, logo.

Dificuldade 3: sempre que a sua mente fugir, volte ao que estava fazendo. Mas era exatamente o que eu estava fazendo que provocou a fuga do pensamento. Volto para onde e para o quê? Se tenho que ter a atenção voltado para o momento e o momento é tenso, extrapolo a tensão? Isso não se opõe ao proposto? Quem escreveu essa merda de manual que não orienta com clareza? Indica palavras, me guia. Se eu achasse o caminho com facilidade, já seria coach de mindfulness e, ainda, ganharia dinheiro escrevendo manuais melhores.

Se até aqui já era complicado, a seguir vem o nível “hard”. Atenção plena do corpo e Meditação de exploração do corpo. Como um alérgico faz isso? Não fico três segundos sem me coçar. Só durante a escrita dessa frase, já cocei a mão, o pescoço, o olho direito, a bochecha esquerda e o colo. Tenho atenção plena aos lugares em que meu corpo coça, não sobra tempo nem espaço para o resto.

Por enquanto, parei por aqui. Estou ficando ZEN. Zen paciência. Me acompanhem para mais dicas dessa porra de mindfulness. Ainda chego lá. Até nosso próximo FLOW. Fui.

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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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