Maria Avelina Fuhro Gastal
Para o bem e para o mal, o olfato é o meu sentido menos apurado.
Mesmo com essa limitação, há aromas que reconheço, cheiros que me envolvem e me levam a lembranças ternas.
Cheiro de terra molhada, de grama cortada, de mato fechado provocam em mim sensação de liberdade. Desprendo-me do material, do aqui/agora, e me deixo levar pela natureza.
Aconchego encontro em cheirinho de bolo assando. Bolo feito em casa, pelas mãos de alguém que nos acarinha.
Pertencimento, no cheiro de carne assando que se espalha pela praia nos finais de semana. São famílias, amigos usufruindo da convivência em um tempo sem relógios nem compromissos inadiáveis.
Cheiro de casa limpa me traz paz e sensação de segurança. Estou em um lugar que me acolhe e me protege.
Lenha queimando me inspira proximidade e liberta fantasias.
Talco de bebê é pura tranquilidade recheada de um amor sem medida.
Roupa e lençol cheirosos, mais do que me cobrir ou agasalhar, me aninham. São meu casulo para a transformação.
E “para não dizer que não falei de flores” (Geraldo Vandré-1968), invisto nelas o sentido da visão. São belas, me alegram, mas não gosto do cheiro da maioria. Talvez essa seja uma forma sensata de lidar com a vida: não desistir de algo que de alguma maneira te encante só porque um detalhe não te agrada.
Há apenas um cheiro de flor que tem me instigado. Ele me envolve sem aviso prévio, sempre no mesmo canto da minha sala, sem nada que possa justificar a presença. Me lembra o cheiro da minha mãe. Assim como vem, vai. Talvez eu não esteja só.
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