Maria Avelina Fuhro Gastal
Criamos o monstro que nos devora.
Lutamos, fugimos, ignoramos, enfrentamos, mas sempre perdemos.
Tentamos domá-lo em páginas de agendas, listas de tarefas, ponteiros de relógio, folhas de calendário. Nelas não cabem desejos e sonhos.
Fatiamos a vida em anos, meses, dias, turnos, horas, minutos e segundos.
Ócio não tem espaço no tempo compartimentado. Podamos nossas asas, abortamos voos, enclausuramos criatividade, cronometramos alegrias.
A natureza não conta o tempo; vive ciclos. Neles, há um tempo para o plantio, outro para a colheita; um para a reclusão e um para a reunião; para o dia e para a noite; um tempo de chuvas, outro de seca; um de enamoramento, outro de acasalamento e reprodução. Os ciclos se alternam e preservam a continuidade da vida.
O capital vive do nosso tempo. Transforma o que somos em mercadoria. Precifica nossa existência, controla nossos quereres, limita nossa vida.
Querer controlar o nosso próprio tempo é servir ao controle estabelecido sobre ele.
Alimentamos o monstro que nos devora, o sistema que não enxerga pessoas, somente cifrões.
Só vivemos como ciclo o nascimento e a morte. Entre os dois momentos, somos engrenagem, substituída se não obedecer ao comando supremo que acredita ser tempo, dinheiro.
O tempo que nos liberta não está na conta das horas. Ele vive em nossas vontades, sonhos, desejos e afetos. Não precisa ser contabilizado nem controlado. Não nos faz prisioneiros nem devedores. Ele nos faz aventureiros, livres para o encontro do significado em existir.
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