Sem tag nem portaria


Maria Avelina Fuhro Gastal

O lago é natural, se poluído e impróprio para banho, a culpa é nossa. O espaço kids não tem cercas, grades nem grama artificial, estende-se por quilômetros onde, além de balanços, escorregadores e gangorras, as crianças podem colher florzinhas, observar formigas, imaginar mundos. Não há placa indicando o “wellness center”. O bem-estar circula em espaço aberto, sob a luz do sol ou das cores do crepúsculo. Nenhum mundo à parte.

A circulação independe de “tags”, identificação na portaria ou da quantidade de dinheiro que cabe em sua conta bancária ou em algum paraíso fiscal. Seja o tênis Nike ou outro qualquer, sejam as camisetas e bermudas Adidas ou Live, desfilarão acompanhadas de marcas populares. De comum, a transpiração abundante que desconhece o “dress code” das classes sociais.

Há uma semana, minha caminhada diária de seis quilômetros ganhou mais quatro. Aos poucos vou descobrindo recantos, redescobrindo o Guaíba. O novo trecho da orla nos devolveu um pouco daquele que para nós sempre será rio. Ali, o verdadeiro espaço “Golden”, acessível a todos.

Uma cidade mais humana requer mais espaços de convívio, mais ocupação das ruas. A vida atrás de grades nos torna individualistas, perdemos a noção de sociedade, descuidamos do que não está dentro de nossos domínios.

Pudesse haver em todos os cantos da cidade praças em condições de uso, ruas saneadas, urbanizadas e arborizadas, espaços de convivência onde brincadeiras, músicas e arte dessem o tom da harmonia, viveríamos com menos medo e preconceito. O Guaíba não está em toda a cidade, as pessoas estão.

Insistimos em erguer barreiras, vender ideia de exclusividade daquilo que deveria ser de todos. Vemos igualdade na mesma cor de pele, no mesmo status social, na mesma classe econômica. Tornamos igualdade o que nos torna diferentes, eliminamos como diferentes todos que são iguais a nós, simplesmente pessoas.

Todos apodreceremos da mesma forma depois de mortos. O que não é dito é que muitos apodrecem em vida quando negam a igualdade da condição humana.

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Maria Avelina Fuhro Gastal

E-mail: avelinagastal@hotmail.com

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